Manifestação contra RDC reúne mais de 100 arquitetos e engenheiros em Brasília
3 de abril de 2014 |
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Um grupo de cerca de cem arquitetos, urbanistas, engenheiros e estudantes de arquitetura realizou ontem (02/04), diante do Anexo III da Câmara dos Deputados, um ato público em repúdio à MP 630/13, que amplia o uso do polêmico Regime Diferenciado de Contratação (RDC) para todas as obras públicas de todas as esferas administrativas. Hoje o instrumento é utilizado para grandes obras tidas como emergenciais como os aeroportos, os estádios da Copa, as Olimpíadas, o PAC e o SUS, e só na esfera federal.
Em seguida, uma comissão das entidades que promoveram o protesto foi recebida pelo presidente da Câmara, deputado Henrique Eduardo Alves (PMDB/RN), que anunciou a votação da MP para esta semana, pois ela “trava” a pauta da discussão de outros projetos.
Segundo o presidente anunciou na reunião, ele defenderá a aprovação da medida nos moldes do texto original enviado pelo governo em fins de dezembro. Ou seja, estendendo o uso do RDC apenas para “as obras e serviços de engenharia para construção, ampliação e reforma de estabelecimentos penais e unidades de atendimento socioeducativo”.
A decisão de Henrique Alves se baseia em recomendação da assessoria da Mesa, que entendeu serem “estranhas ao objeto da MP” as modificações sugeridas pela senadora e ex-ministra da Casa Civil Gleisi Hoffmann, relatora da medida, e que por isso devem ser “escoimadas” da proposta. Na linguagem corriqueira do Congresso, esse tipo de mudança tem um nome: “jabuti”, em alusão ao réptil que no folclore indígena é um personagem esperto que sempre tira o melhor partido nas apostas que faz com outros animais.
Para Haroldo Pinheiro, presidente do Conselho de Arquitetura e Urbanismo (CAU/BR), se isso ocorrer, “será uma meia vitória, pois o ideal seria os deputados rejeitarem a MP, estimulando o Congresso a tratar dessa matéria de forma consolidada no âmbito da revisão da lei das licitações, a 8666/93, que está tramitando no Senado”. Segundo ele, o Conselho reconhece que essa legislação deve ser atualizada, mas não de forma açodada, via MPs, com pouco tempo de discussão com a Sociedade. Nessa discussão, o instrumento do RDC poderia ser melhor avaliado.
O senador Pedro Simon (PMDB/RS), relator da lei 8666/93, tem a mesma opinião. Segundo ele, a aprovação da MP 630/13 nos moldes propostos por Gleise Hoffmann, e aprovados pela Comissão Mista do Congresso, seria um escândalo por afrontar a lei das licitações e acabar com qualquer fiscalização. A revisão foi proposta em 2007 e há uma expectativa de que a relatora da matéria, a senadora Katia Abreu (PMDB/TO), apresente logo seu parecer, pois é ideia do presidente do Senador, Renan Calheiros (PMDB/AL), discutir o assunto com urgência.
O Instituto de Arquitetos do Brasil (IAB), a Federação Nacional de Arquitetos e Urbanistas (FNA), a Associação Brasileira de Escritórios de Arquitetura (AsBEA), a Associação Brasileira de Ensino de Arquitetura (ABEA), a Associação Brasileira de Arquitetos Paisagistas (ABAP) e a Federação dos Estudantes de Arquitetura (FeNEA) organizam o movimento, com apoio do Conselho de Arquitetura e Urbanismo do Brasil (CAU/BR). Também se opõem à MP o CONFEA (Conselho Federal de Engenharia e Agronomia), o Sindicato da Arquitetura e Engenharia (Sinaenco) e a Associação Nacional dos Servidores Públicos Engenheiros (as), Arquitetos (as) e Agrônomos (as) do Poder Executivo Federal (ANSEAF), entre outras entidades.
MANIFESTAÇÃO – Antes da reunião com o presidente da Câmara dos Deputados, os mais de 100 arquitetos, engenheiros e estudantes que protestavam contra o RDC promoveram um debate sobre os problemas trazidos pelo modelo que o governo quer adotar em todas as obras públicas. O presidente do IAB-DF, Thiago de Andrade, destacou que o RDC abre muitas brechas para o aumento de custos nas obras. “É do interesse das empreiteiras fazer o projeto durante a obra, para que elas possam ajustar os gastos de acordo com suas expectativas de lucro”, afirmou. “É muito pernicioso não ter um documento que embase a fiscalização e o controle”.
Também o presidente do CAU/BR, Haroldo Pinheiro, falou aos estudantes, explicando a importância da discussão para os profissionais de arquitetura e para a Sociedade como um todo. “Trata-se da defesa do projeto completo, que deve ser contratado pelo governo, antes da licitação da obra, separando bem quem projeta de quem constrói”.
REUNIÃO – O encontro com Henrique Alves foi organizado pelo deputado Augusto Coutinho, (SSE/PE), presidente da Frente Parlamentar em Defesa da Engenharia, Arquitetura e Agronomia. Apesar da notícia da provável reversão da MP 630/13 para seu texto original, a comissão manteve sua posição contra o RDC.
“Alegar que o regime especial acelera as obras é falacioso, pois estamos vendo todo dia na mídia exemplos de obras, como os estádios da Copa, que atrasaram e custaram mais caro. E agora surgem também denúncias de creches feitas com materiais mais baratos que já apresentam problemas e certamente custarão muito mais para os bolsos dos cidadãos que pagam impostos para que os recursos públicos sejam bem empregados”, afirmou Haroldo Pinheiro. “Se ficar tudo nas mãos do empreiteiro, do projeto à fiscalização, o governo privatiza a administração e mata o planejamento”.
Na mesma linha, o presidente da Associação Nacional dos Servidores Públicos Engenheiros (as), Arquitetos (as) e Agrônomos (as) do Poder Executivo Federal (ANSEAF), , José Roberto Senno, disse que o TCU já comprovou que o eventual ganho de 90 dias no prazo de início da obra não significa que ela seja concluída na data planejada. “Há atrasos de até quatro anos”. Para ele, o RDC só serve às grandes empreiteiras que atuam nas grandes cidades.
O arquiteto Jefferson Salazar, presidente da Federação Nacional de Arquitetos e Urbanistas (FNA), denunciou o uso de “redecezinhas” por Prefeituras de pequenas cidades, para construção de pequenos conjuntos do programa Minha Casa, Minha Vida, com financiamento da Caixa Econômica Federal. “A CEF financia mas na hora em que as casas tiverem problemas, os prefeitos é que irão ser acionados pela população. Os moradores e os prefeitos estarão juntos na mesma condição de vítimas dessa política de gestão dos recursos públicos com base na emergência”.
A maior parte das entidades que participaram da manifestação do dia 2 são signatárias do documento “As Obras Públicas e o Direito à Cidade”, endereçado ao Governo Federal, aos parlamentares e ao TCU, propondo que as licitações de obras públicas sejam feitas somente a partir de projetos completos e a extinção da chamada “contratação integrada” prevista no RDC.
COMISSÃO – Integravam a comissão que se reuniu com o presidente da Câmara:
– Deputados Augusto Coutinho (SSE-PE), engenheiro e presidente da Frente Parlamentar em Defesa da Engenharia, Arquitetura e Agronomia,; e Zezeu Ribeiro (PT/BA), arquiteto, ex-presidente do IAB da Bahia;
– CAU: Haroldo Pinheiro, presidente do CAU/BR; Gilson Paranhos, assessor de assuntos parlamentares e institucionais do CAU/BR; Antonio Luciano Guimarães, presidente do CAU/CE; Karinne Santiago Almeida Dantas, presidente do CAU/SE; Osvaldo Abreu de Souza, presidente do CAU/MS, Paulo Saad, conselheiro federal (Rio); e José Eduardo Tibiriçá, ouvidor
– CONFEA: José Tadeu da Silva, presidente
– IAB: Iran Dudek, vice-presidente do IAB nacional, representando o presidente Sérgio Magalhães; Thiago Teixeira de Andrade, presidente do IAB/DF; e Gregório Repsold, ex-presidente do IAB nacional
– FNA: Jefferson Salazar, presidente
– ANSEAF: José Roberto Senno, presidente
– Sinaenco: Sergei Augusto Monteiro Fortes, do Conselho Diretor Nacional; e Antonio Trindade, secretário executivo
A manifestação contou com a participação de dezenas de estudantes da Escola da Cidade, de São Paulo, coordenados pelo prof. José Paulo Gouvea.
Saiba mais sobre a MP 630/13 e sua tramitação no Congresso em:
CAU/BR reúne arquitetos e urbanistas em Brasília para o 2º Seminário Legislativo
MP 630: Comissão aprova ampliação da contratação diferenciada. Projeto segue para Plenário da Câmara
Fonte: CAU/BR